terça-feira, março 17, 2009

DOENÇAS CAUSADAS POR GASES E VAPORES TÓXICOS

1 . INTRODUÇÃO
Segundo HENDERSON E HAGGARD, os gases e vapores podem ser classificados Em quatro grupos:
• irritantes,
• asfixiantes (simples e químicos),
• narcóticos,
• tóxicos sistêmicos.
Esta classificação agrupa os gases e vapores do ponto de vista fisiopatológico, considerando principalmente a sua principal ação sobre o organismo.
Assim é que, certos gases narcóticos tem, além do efeito narcótico, efeitos sistêmicos ou apenas efeitos irritativos.
Abordaremos somente gases e vapores do grupo IV de Henderson e Haggard, ou seja compostos inorgânicos ou órgano-metálicos de ação sistêmica.
Podemos agrupa-los em :
1 - compostos tóxicos protoplasmáticos: mercúrio e fósforo
2 - compostos órgano-metálicos: chumbo-tetraetila, arsina, níquel-carbonila, etc.
3 - compostos inorgânicos hidrogenados: fosfina, gás sulfídrico, etc.
1 . COMPOSTOS TÓXICOS PROTOPLASMÁTICOS
Os compostos tóxicos protoplasmáticos são aqueles que agem diretamente sobre as células, principalmente, naquelas ricas em protoplasma.
Podem agir mesmo em pequenas quantidades, sem necessitar de outras alterações anatômicas ou funcionais para que a sua ação se manifeste. Por exemplo, o monóxido de carbono (CO) combina-se com a hemoglobina impedindo o transporte normal de oxigênio para os tecidos.
Sua ação manifesta-se indiretamente, pela anoxia que produz em vários órgãos e tecidos.
Por outro lado, o mercúrio, que é um tóxico protoplasmático, age diretamente sobre as células, intervindo em seu metabolismo. No entanto, as substâncias assim classificadas podem agir igualmente em todas as células, quando presentes em altas concentrações, ou produzir seus efeitos nocivos somente em alguns tecidos ou órgãos que sejam particularmente mais sensíveis.
Citaremos como exemplos deste grupo o mercúrio (Hg) e o fósforo (P) que também serão tratados em capítulos especiais.
MERCÚRIO (Hg)
O mercúrio é um metal líquido que se volatiliza facilmente à temperatura ambiente, contaminando assim, a atmosfera do local de trabalho.
A intoxicação profissional pelo mercúrio se faz através da inalação destes vapores.
Quando ele está em altas concentrações, o trabalhador pode apresentar quadro de intoxicação aguda.
Estão expostos todos os trabalhadores que manipulam o mercúrio: indústria de termômetros ou barômetros, laboratórios químicos, indústria eletrônica, indústrias de lâmpadas, industrias químicas, etc.
Sendo um tóxico protoplasmático, penetra no organismo, localizando e agindo sobre as células ricas em protoplasma; células hepáticas ou túbulos renais, do sistema nervoso e das mucosas.
Elimina-se através das fezes (bile e intestino delgado), saliva, suor, leite e urina.
Ao ser eliminado, devido a sua ação cáustica pode causar lesões nos locais onde se põe em contato; estomatites, enterites, gastrites, etc.
Como sintomas prodrómicos da intoxicação crônica, o trabalhador pode apresentar: cefaléia, insônia, nistagmo, fibrilações musculares, dispnéia, gengivite hemorrágica, sialorréia com sabor metálico, anemia hipocrómica, etc.
A intoxicação crônica caracteriza-se pela predominância de sintomatologia digestiva e nervosa: estomatites (com gengivite e faringite), encefalopatia mercurial (hiperexcitabilidade, cefaléia com vertigens, angústia, tremores dos dedos, delírios, etc) e paralisias neurológicas com possível caquexia associada. Poucas vezes a nefrose esta associada.
Na anatomia patológica são encontradas desmielinizações de troncos nervosos, principalmente do cerebelo.
O homem normal elimina 10 g de mercúrio na urina, por dia. A injeção de BAL (British Anti-Lewisite) que é 2,3, dimercaptopropano determina; em casos de mercurialismo, aumento considerável na eliminação do mercúrio na urina.
FÓSFORO (P) E SEUS COMPOSTOS
O fósforo branco que era utilizado nas indústrias, dada a sua alta toxicidade, foi gradativamente substituído pelo fósforo vermelho e o sesquisulfeto de fósforo.
O homem se expõe profissionalmente ao fósforo, em vários tipos de atividades industriais: indústria de produtos fosforescentes (tipo lâmpadas), de fogos de artifícios, de armas e explosivos, de pesticidas, de fósforos de segurança, etc.
A via de absorção mais importante num ambiente de trabalho é a respiratória, mas deve-se levar em conta a sua solubilidade em gordura, quando consideramos a sua penetração através da via cutânea ou digestiva. Da mesma forma não se deve administrar leite ou óleo para "neutralizar" a ação do veneno (contendo fósforo) ingerido acidentalmente ou não.
O fósforo é eliminado sob forma de vapores (com odor de alho) pela via respiratória, através de vômitos ou fezes ou sob forma de fosfatos pela via urinária.
A exemplo do mercúrio, o fósforo é um veneno protoplasmático, portanto lesa as células ricas em protoplasma; células hepáticas, dos túbulos renais, do córtex da supra-renal, do endotélio dos vasos e do miocárdio.
A intoxicação crônica (a profissional) caracteriza-se pelo aparecimento de sintomas gerais (anorexia, astenia, sintomas e sinais vagos do aparelho digestivo, etc).
Importantes, porém são as alterações hepáticas e as alterações ósseas, principalmente as da mandíbula.
COMPOSTOS ÓRGANO- METÁLICOS
São compostos que na sua estrutura comportam uma parte metálica e outra orgânica.
Em geral, a toxicidade destes compostos está na dependência do metal, porém a rapidez da absorção e do aparecimento da sintomatologia está na dependência da parte orgânica e da volatilidade do composto.
Podemos citar vários exemplos dos gases e vapores que constituem este grupo: a arsina, o chumbo tetra-etila, o níquel-carbonila, etc.
CHUMBO TETRA-ETILA
O chumbo tetra-etila é um líquido suficientemente volátil a temperatura ambiente para produzir uma contaminação no ar do ambiente de trabalho.
O homem se expõe profissionalmente:
• Na preparação e manipulação do composto que é adicionado à gasolina como antidetonante;
• Na limpeza de tanque de estocagem do composto;
• Na manipulação de gasolinas contendo chumbo tetraetila.
O chumbo tetra-etila penetra no organismo através da inalação de vapores, da pele e do tubo digestivo. É armazenado no fígado e também distribuído em todo o organismo, principalmente no cérebro onde exerce a sua ação tóxica. Produz uma inibição das fosforilações oxidativas e da 5-hidroxi-tiptofane decarboxilase. Esta última ação provoca uma redução da concentração de serotonina no cérebro.
O quadro clínico é diferente daquele que aparece na intoxicação crônica pelo chumbo inorgânico.. Predominam os efeitos do chumbo tetraetila sobre o sistema nervoso central: cefaléia, insônia, pesadelos, nervosismo, irritabilidade, e sintomas gastrointestinais leves podem aparecer precocemente.
No seu quadro mais grave, freqüentemente os pacientes experimentam episódios de comportamentos maníacos. A intoxicação aguda manifesta-se pela fadiga, fraqueza, perda de peso, dores musculares, tremores, queda do purbo, queda da Pressão Arterial. Também é irritante da pele e mucosas.
Para o diagnóstico são importantes o antecedente profissional, o quadro clínico e a dosagem de chumbo na urina e/ou no sangue. Predominando o quadro neurológico, deve-se fazer o diagnóstico diferencial com delirium tremens.
O tratamento pode ser semelhante ao tratamento administrado aos intoxicados crônicos por chumbo inorgânico.
ARSINA (As H3)
A arsina é um gás incolor, mais pesado que o ar e que se forma quando o arsênico trivalente entra em contato com o hidrogênio nascente. Esta reação ocorre, em geral, acidentalmente, em processos metalúrgicos que envolvem substâncias que contém arsênico como impurezas.
O risco de intoxicação existe em locais onde utiliza zinco, chumbo, cobre, enxofre, ouro, prata etc. que contenham impurezas arsenicais, na limpeza de tanques, no funcionamento de acumuladores, na indústria química, (por ex. produção de cloretos e sulfatos de zinco) ,etc.
O quadro de intoxicação leve caracteriza-se por cefaléia, vertigem, hálito de odor aliáceo, anemia ligeira e taxa elevada de arsênico na urina.
É um veneno essencialmente hemolítico, e, em quadros mais graves aparecem sintomas mais característicos: ligeira icterícia, hemoglobinúria, seguido de anúria pela necrose tubular aguda e anemia severa (hemolítica). A morte sobrevêm por falência cardíaca e edema agudo do pulmão. Se o indivíduo sobrevive, insuficiência renal crônica ou neuropatia periférica pode ficar como seqüelas.
O prognóstico depende da função renal restante e das intensidade das altercações nervosas.
O tratamento deve ser sintomático. Pode-se dizer:
1. sanguíneo transfusão
2. diálise
- a administração do BAL tem pouco valor para o quadro agudo, mas pode prevenir o aparecimento de efeitos tardios do arsênico.
NÍQUEL-CARBONILA Ni (CO)4
O níquel-carbonila é um liquido volátil (ebulição a 43o C) decompondo-se facilmente em níquel e monóxido de carbono.
É um produto intermediário na manipulação do níquel.
Apresenta uma toxicidade muito grande e penetra através da via respiratória e cutânea.
Os efeitos agudos da exposição ao níquel-carbonila são caracterizados por duas fases:
1a fase: o paciente se queixa de cefaléia, vertigens, náuseas, vômitos que desaparecem se o mesmo respira ar fresco.
2a fase: depois de 12 a 36 h, sobrevêm os sinais de pneumonia química com: dores retro-esternais, sensação de constrição torácica, tosse, dispnéia, cianose, seguindo-se um estado de delírio e convulsões. Casos fatais, submetidos à autópsia, mostram os pulmões com focos hemorrágicos, atelectasia e necroses e o cérebro com focos hemorrágicos.
Quanto aos efeitos crônicos, sabemos que a incidência de câncer das fossas nasais e dos pulmões é maior nos trabalhadores expostos ao níquel-carbonila.




COMPOSTOS INORGÁNICOS HlDROGENADOS
FOSFINA (H3P)
E um gás incolor, mais pesado que o ar, produzido pela ação da água sobre o fósforo, na conservação ou transporte do ferro-silicio que contém fosfato de cálcio como impureza, no emprego de fosfato de zinco como raticida, no uso de acetileno que pode conte-la como impurezas, etc.
Fisiologicamente pode agir de modo agudo e crônico. O quadro agudo caracteriza-se pelo aparecimento de sintomatologia nervosa (vertigens, cefaléia, tontura, tremores de extremidades, convulsões e coma), e sintomas respiratórios: dor torácica, dispnéia, tosse e às vezes edema agudo do pulmão.
O tratamento é sintomático.
GÁS SULFIDRICO (H2S)
E um gás de odor forte (ovo podre), incolor, com densidade maior do que o ar.
O homem se expõe profissionalmente ao gás sulfídrico:
a. em locais onde há matéria orgânica em decomposição
b. na fabricação da seda artificial pelo processo viscose
c. na refinaria de petróleo (impurezas contendo enxofre)
d. na fabricação de gás de iluminação
e. na indústria de borracha
É um gás altamente irritante e tem sua ação local mais importante, agindo principalmente no trato respiratório alto e conjuntivas oculares.
Como ação sistêmica podemos ter:
a . excitação seguida de depressão do sistema nervoso central, particularmente do centro respiratório
b. inibição da citocromo-oxidase a transformação da hemoglobina em sulfo-hemoglobina.
O quadro clínico pode ser subdividido em :
• superagudo: O paciente tem convulsões, perde subitamente a consciência e
apresenta dilatação da pupila.
• agudo: O paciente pode apresentar dois tipos de sintomas:
1. sintomas respiratórios: tosse, as vezes com expectoração hemoptóica, polipnéia, edema agudo do pulmão;
2. sintomas nervosos: sensação de desmaio, cefaléia, náusea, vomito, hiperexcitabilidade e convulsões podendo terminar em morte por asfixia.
c. sub-agudo: A sintomatologia é devida às irritações locais: querato-conjuntivites com ulcerações superficiais da córnea, fotofobia, bronquites e distúrbios digestivos (náusea e vômitos). Alguns sintomas neurológicos podem aparecer: contraturas musculares, cefaléias, vertigens, sonolência, amnésia, delírio etc.
d. crônica: A existência de sintomatologia crônica devida a exposição ao gás sulfídrico é objeto de controvérsias mas, certamente é responsável pela existência de bronquites crônicas. O diagnóstico é feito quase que exclusivamente pela história (anammese profissional) e tratamento sintomático.

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